Fim das aulas obrigatórias para CNH: risco ao trânsito ou avanço na inclusão?
- João Falanga
- há 19 horas
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O que mudou na CNH
O Contran aprovou, em 1º de dezembro de 2025, uma resolução que retira a obrigatoriedade de frequentar autoescolas para obter a Carteira Nacional de Habilitação (CNH).
Entre as principais alterações:
O conteúdo teórico poderá ser feito online — gratuitamente pelo governo — ou de forma presencial em escolas ou instituições credenciadas.
A carga horária mínima para aulas práticas caiu de 20 para apenas 2 horas.
O candidato poderá fazer as aulas práticas com instrutor autônomo credenciado pelos Detrans, e até usar veículo próprio, desde que em conformidade com as normas de segurança previstas no Código de Trânsito Brasileiro.
Provas teóricas e práticas continuam obrigatórias — ou seja, não basta “declarar” que sabe dirigir, é necessário passar nos exames.
Segundo o governo, o objetivo é reduzir custos e burocracia: o processo poderá ficar até 80% mais barato.
Por que a mudança é vista como positiva
Redução de custo: o alto preço da habilitação frequentemente impede pessoas de obter CNH. Com as novas regras, o acesso pode se tornar mais democrático. Você terá mais opções — aulas online gratuitas e instrutores autônomos —, reduzindo dependência de autoescolas custosas.
Maior inclusão: sobretudo em regiões com poucas autoescolas, ou para quem não tem recursos para pagar várias aulas, a flexibilização pode facilitar o direito de dirigir, beneficiando especialmente jovens ou pessoas de menor renda.
Simplificação do processo: tornar o sistema mais leve e menos burocrático pode aumentar a regularização de condutores, reduzindo o número de pessoas dirigindo sem habilitação formal.
Os riscos e o lado “permissivo” da medida
Embora a intenção seja boa, a flexibilização traz riscos reais — e a grande preocupação é se essa mudança não trará um trânsito mais caótico e inseguro. Alguns dos problemas potenciais:
Treinamento insuficiente: 2 horas de prática podem não ser suficientes para que um novato aprenda a dirigir com segurança, especialmente em situações complexas de trânsito — como tráfego intenso, freadas de emergência, balizas, colisões, imprevisibilidade de pedestres ou ciclistas.
Falta de padronização e fiscalização: com instrutores autônomos e uso de veículos próprios, há maior variabilidade na qualidade do ensino. A responsabilidade de garantir segurança e preparo real do condutor recai sobre exames, que podem não reproduzir todos os riscos do dia a dia.
Motoristas menos preparados: pessoas que aprenderem “por conta própria” ou com instrução mínima podem ter lacunas no conhecimento de regras de trânsito, direção defensiva, convivência em vias públicas. Isso poderia aumentar infrações, acidentes, imprudência.
Sensação de “liberdade para dirigir sem preparo”: ao baratear e facilitar acesso à CNH, a medida pode gerar a impressão de que basta passar na prova — e não de que dirigir é responsabilidade séria, exige formação consciente e prática consistente.
A flexibilização da CNH só será segura se vier acompanhada de exames realmente duros, fiscalização firme e instrutores bem credenciados. Sem isso, o risco é claro: motoristas recém-habilitados com pouca prática podem ampliar a insegurança nas ruas. Para evitar essa piora, o país precisa de avaliações mais completas, auditoria dos centros de prova e campanhas contínuas de direção defensiva. Assim, a redução de custos não se transforma em redução de responsabilidade.
Discussão: inclusão ou risco real?
A intenção declarada — democratizar a CNH e reduzir o número de motoristas sem habilitação — parece justa e alinhada com uma política de inclusão. Em um país com desigualdades sociais e custos elevados, facilitar o acesso ao direito de dirigir pode abrir oportunidades de trabalho, mobilidade e autonomia.
Por outro lado, há a preocupação legítima de que o trânsito, que já convive com congestionamentos, imprudência, infrações e alta taxa de acidentes, receba um número maior de motoristas com preparo mínimo. Se a formação — particularmente a prática — for superficial, temos um perigo real de piora na segurança viária e na convivência no trânsito.
Minha opinião: a medida tem potencial positivo se vier acompanhada de fiscalização rigorosa, seleção criteriosa de instrutores, exames realmente exigentes e campanhas de educação no trânsito. Sem esses contrapesos, o risco de “quantidade em vez de qualidade” é real, e o trânsito pode sim piorar.
Conclusão
A reforma aprovada pelo Contran representa um marco importante: flexibiliza, barateia e amplia o acesso à CNH — algo que pode representar inclusão social e maior mobilidade. Mas flexibilizar também significa abrir espaço para desequilíbrios. O segredo está em garantir que a formação e a avaliação continuem robustas, para que dirigir não se torne sinônimo de dirigir mal.






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