Novo Marco do Licenciamento Ambiental no Brasil: Entenda o PL 2.159/2021
- Sabrina Barbosa Silva
- 20 de jul.
- 4 min de leitura

A aprovação do Projeto de Lei nº 2.159/2021 representa um divisor de águas para a legislação ambiental brasileira. Trata-se da primeira tentativa de consolidação nacional das normas sobre licenciamento ambiental, visando maior previsibilidade e eficiência nos processos. No entanto, o novo marco divide opiniões entre setores produtivos, ambientalistas e instituições internacionais. Neste artigo, analisamos minuciosamente o texto aprovado, suas inovações, riscos e implicações futuras.
O que é o Licenciamento Ambiental
O licenciamento ambiental é o processo administrativo pelo qual o Estado autoriza, acompanha e fiscaliza atividades com potencial impacto ambiental. Seu objetivo é assegurar que os empreendimentos atendam às exigências legais e técnicas que garantam a mitigação dos danos ao meio ambiente.
Panorama Legal Anterior
Antes do PL 2.159/2021, o Brasil carecia de uma lei federal específica para o tema. O arcabouço jurídico era fragmentado, apoiando-se:
Na Lei nº 6.938/1981 (Política Nacional do Meio Ambiente)
No artigo 225 da Constituição Federal
Na Resolução CONAMA nº 237/1997
Em normas estaduais e municipais
O modelo mais comum era o Licenciamento Trifásico (LP, LI e LO), que demandava estudos de impacto e audiências públicas conforme a complexidade do empreendimento.
Por que o Brasil Precisava de uma Nova Lei
Relatórios do IBAMA e da CGU indicavam:
Sobrecarga institucional
Falta de padronização
Morosidade
Ausência de segurança jurídica
A Abema já alertava sobre o risco de colapso desde 2013. Assim, o novo marco foi justificado como uma resposta necessária à modernização.
Principais Mudanças do PL 2.159/2021
O projeto cria um sistema legal unificado, com novas modalidades e prazos definidos para a emissão de licenças.
Novas Modalidades de Licença
Tipo de Licença | Descrição | Prazo |
LP (Licença Prévia) | Fase de planejamento | 6 a 10 meses |
LI (Instalação) | Início da obra | 3 meses |
LO (Operação) | Funcionamento do empreendimento | 3 meses |
LAU (Única) | Substitui LP, LI e LO | 3 meses |
LAC (Adesão e Compromisso) | Autodeclaração do empreendedor | Imediata |
LOC (Operação Corretiva) | Regularização de atividades já em funcionamento | 3 meses |
LAE (Especial) | Para projetos estratégicos com impacto significativo | 3 meses |
Atividades Isentas de Licenciamento
O novo texto exclui do processo:
Cultivo de espécies agrícolas (temporárias ou perenes)
Pecuária extensiva e semi-intensiva
Pecuária intensiva de pequeno porte
Empreendimentos militares
Usinas de triagem e reciclagem
Obras de distribuição elétrica de até 69 kV
Essa flexibilização é motivo de acalorado debate.
Simplificação para Saneamento e Agropecuária
Projetos de saneamento básico terão prioridade na tramitação e procedimentos simplificados.
Já para a pecuária intensiva de médio porte, a LAC será aplicável sem análise técnica prévia, o que pode gerar preocupações quanto ao controle sanitário e ambiental.
Consulta Prévia e Participação Pública
A nova legislação:
Mantém a exigência de EIA/RIMA apenas para casos de grande impacto
Não define critérios objetivos para o que é “significativo”
Limita a audiência pública à fase pós-EIA, restringindo a influência da população no início do processo
Críticas ao Projeto
Principais pontos críticos:
Autolicenciamento (LAC): Reduz a ação fiscalizatória do Estado
Redução da participação pública
Falta de critérios objetivos para dispensa de estudos
Risco de repetição de tragédias ambientais, como Mariana e Brumadinho
Organizações como o Observatório do Clima e o MMA se posicionaram contra, assim como a própria ONU, que manifestou “profunda preocupação”.
Defesas e Justificativas dos Apoiadores
Entre os principais defensores:
Ministério da Agricultura
Instituto Pensar Energia
Ibram (Mineração)
Argumentam que a lei:
Estimula o crescimento econômico
Elimina gargalos regulatórios
Traz segurança jurídica e previsibilidade para o setor produtivo
Análise Técnica: Benefícios e Riscos
Benefícios potenciais
Redução de prazos
Maior clareza normativa
Aumento da atratividade de investimentos
Foco técnico nos empreendimentos de alto risco
Riscos potenciais
Fragilização da proteção ambiental
Conflitos fundiários com comunidades tradicionais
Dificuldade de responsabilização em casos de desastre
Impactos Esperados no Agronegócio e Indústria
Setores beneficiados:
Energia e infraestrutura (linhas de transmissão, hidrelétricas)
Agropecuária de médio porte
Mineração em áreas remotas
Com a implementação da LAC e das licenças automáticas, muitos empreendimentos anteriormente travados por barreiras burocráticas poderão avançar.
Preocupações Internacionais e Direitos Humanos
A ONU já expressou preocupação com a fragilização dos controles ambientais, especialmente diante da emergência climática. Há receio de que o Brasil:
Rompa compromissos climáticos internacionais
Aumente o desmatamento na Amazônia
Amplie conflitos com povos originários
O Papel da Fiscalização no Novo Modelo
Apesar de o governo sustentar que o novo modelo não elimina a fiscalização, há risco de enfraquecimento do aparato institucional, caso não haja:
Reforço orçamentário para os órgãos ambientais
Transparência nos formulários de autodeclaração
Auditorias regulares por entidades independentes
Cenários Futuramente Possíveis
Cenário otimista:
Implementação eficiente com fortalecimento dos órgãos fiscalizadores
Integração digital e maior previsibilidade para todos os setores
Cenário pessimista:
Multiplicação de casos como o de Brumadinho
Redução drástica da participação social
Judicialização em massa de empreendimentos questionáveis
Uma Nova Era ou Um Retrocesso?
O PL 2.159/2021 é, sem dúvida, um marco histórico. Contudo, sua eficácia dependerá da forma como for regulamentado, fiscalizado e aplicado. Se por um lado traz promessas de modernização e agilidade, por outro levanta sérias dúvidas sobre a proteção ambiental, participação democrática e responsabilidade social do Estado brasileiro.
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